Cadeiras | Cadeira 45

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Cadeira 45
Fundador: José Sérgio Franco
Patrono Cleber Antônio Jansen Paccola

(1953 – 2011) Existem pessoas que permanecem em nossos pensamentos, apesar de fisicamente não estarem mais conosco. Não são meros passageiros em nossas vidas, ficando gravados na memória pela força de seu legado e de sua vitalidade. Cleber Paccola foi uma destas pessoas. Graduado em Medicina pela Universidade de São Paulo em Ribeirão Preto em 1972, foi aprovado em primeiro lugar na prova da SBOT em 1975. No ano seguinte foi contratado como professor assistente no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto. Defendeu sua tese de doutorado em 1978 e neste mesmo ano foi para Hannover na Alemanha para fazer pós-doutorado sob tutela do Prof. Harald Tscherne no Instituto Alexander Von Humboldt. Este foi um marco transformador para Cleber profissionalmente. Enquanto esteve na Alemanha, pode observar os princípios da AO sendo aplicados diariamente. O grupo AO havia iniciado suas atividades no Brasil em 1975 sob orientação do Prof. Hans Willeneger. Junto com os professores Nova Monteiro, Karlos Mesquita, José Soares Hungria Neto e Gottfried Köberle, Cleber foi um dos pioneiros do grupo AO América Latina e contribuiu para o treinamento de centenas de ortopedistas. Ele vivia e respirava a fundação AO. Era Trustee, fundador da AO América Latina, e membro ativo de várias comissões tais como AOTK e o comitê sócio-econômico. Seu interesse especial era a busca por alternativas seguras para ortopedistas que atuavam em locais desprovidos de infra-estrutura adequada. Incansável, Cleber viajou por todo país, disseminando conhecimento e princípios. Fundou, junto à fundação AO um programa de treinamento de ortopedistas em grandes centros de trauma ortopédico. De 2001 a 2011, 183 médicos de todos os estados do Brasil foram treinados pelo serviço da USP Ribeirão Preto. Em 1992 iniciou a especialização em joelho e trauma do membro inferior, treinando mais de 50 ortopedistas. Cleber se tornou docente em 1984 e professor titular em 1995. Apesar de sua dedicação em tempo integral à profissão, não gostava de burocracia, por este motivo nunca se candidatou à chefia do departamento. Era preocupado com as regiões de baixa renda do Brasil e outros países. Buscava diariamente opções acessíveis e reprodutíveis para lugares de menor infra-estrutura. Desenvolveu uma haste intramedular de baixo custo para fixação de fraturas do fêmur sem necessidade de intensificador de imagem, amplamente utilizada e com excelentes resultados. Era ávido por estudos e desafios. Em seu tempo livre, focava em resolver problemas e buscar soluções lógicas. Estava em processo de criação de um guia externo tridimensional para passagem de parafuso percutâneo na pelve, mas não chegou a ser concluído. Outra idéia que não chegou a ser realizada foi uma mudança na técnica de osteogênese por distração com fixador externo, com o alongamento baseado em cálculo matemático, proporcional ao tamanho da fenda criada à medida que se transporta o segmento ósseo. Seria um projeto grande, com fixador motorizado, mas não teve tempo para se dedicar a este projeto. Dizia que seria o maior trabalho da sua vida. Ademais, Cleber possuía uma capacidade incomum para cirurgias. Nas fraturas articulares do joelho, em particular as do planalto tibial, brilhava. Fazia osteotomias com muita facilidade, possuidor de uma visão tridimensional incrível. Modificou a osteotomia de Kramer para casos crônicos de epifisiólise do fêmur, com cunha de subtração da região proximal do fêmur que deixava o fêmur perfeito após a consolidação e remodelação. Todos ficavam impressionados como ele marcava a osteotomia com osteótomos largos, na base do olho e da experiência, e simplesmente ficava perfeito. Também ficou conhecido por suas contribuições nas correções de deformidades angulares combinadas com desvios rotacionais com corte oblíquo único. Cleber realizava artroscopia a gás, evitando o uso de soro e do shaver, que tinha custo proibitivo para muitas pessoas. Afirmava que a técnica não despertou muito interesse exatamente por ser barata. Descreveu também uma técnica de reconstrução de LCP com acesso posteromedial e fixação tipo onlay do enxerto, extremamente segura para os vasos poplíteos. Esta técnica é utilizada até hoje no serviço da USP Ribeirão sem relato de lesão vascular. Com 97 artigos publicados, inclusive em revistas internacionais, sendo muitos com técnicas inovadoras, foi um grande pesquisador e contribuiu para o crescimento das cirurgias ortopédicas e de trauma. Cleber encarava sua vida esportiva de forma semelhante à sua vida profissional. Quando jovem gostava de futebol, mas logo passou ao tênis. Leu inúmeros livros sobre técnicas deste esporte, assistia vídeos de jogadas e punha em prática tanto o aprendizado teórico quanto o adquirido. Mais tarde, ingressou no golfe, que encarou da mesma forma. Não havia meio compromisso com ele, dedicava-se por completo a quaisquer desafios que se propusesse a enfrentar. Quem conviveu com Cleber sabe que possuía um gênio forte. Defendia seus ideais com afinco e com certa frequência entrava em discussões acaloradas. Mas todos concordam que uma de suas maiores vantagens era que não guardava rancor, podendo no momento seguinte conversar normalmente. Cleber faleceu em 2011 após combater um tumor no cérebro por 4 anos. Ao ser diagnosticado, aos 58 anos, foi submetido a um tratamento agressivo da doença, e apesar disso manteve sua rotina diária de trabalho e dedicação. Sempre encarou seu destino de maneira corajosa e otimista, lutando com todas suas forças até o fim. Cleber deixou 3 filhas, sendo que a caçula seguiu seus passos, também fazendo ortopedia. Como filha posso dizer que tive um pai que me serve de exemplo até hoje. Ele nos ensinou de maneira categórica a sermos justas e sempre respeitar e defender o que é certo. A ele devemos nossa eterna gratidão, respeito, admiração e amor. Texto redigido por Ana Maria Paccola, com contribuições do Prof.Dr. Cláudio Henrique Barbieri, Prof.Dr. Maurício Kfuri e Prof.Dr. Fabrício Fogagnolo.